Helena Queirós: “… acabámos todos a cantar canções tradicionais comuns ou muito parecidas… Temos muito em comum, sem dúvida!”

HelenaQueirosHelena Queirós participará como relatora no aPorto Plus que decorrerá entre os dias 25 e 29 de julho. Falamos com ela sobre a sua especialidade: a etnografia portuguesa.

– Existe um folclore galego-português ou será que as fronteiras também deixaram a sua marca aqui?

Não conheço suficientemente a Galiza para responder com propriedade… Mas, logicamente, estamos próximos: na língua, no espaço, obviamente na cultura também. Há uns dias, ouvi José Luís do Pico Orjais, numa palestra, falar do “cancioneiro galego-português”. Para ele, os grandes cantores populares do lado de cá da fronteira fazem parte do cancioneiro galego. Aprendi com Serxio Cobos uns passos das jotas e das muinheiras galegas, e parecia-me que estava a dançar gotas e viras… Há uns meses, dinamizámos no NEFUP – Núcleo de Etnografia e Folclore da Universidade do Porto, grupo a que pertenço, uma oficina de danças portuguesas para um grupo de estudantes galegos, e acabámos todos a cantar canções tradicionais comuns ou muito parecidas… Temos muito em comum, sem dúvida!

– Na Galiza temos a sensação de que a dança ou a música tradicionais não gozam do prestígio, junto da gente nova, de que ainda gozam relativamente na Galiza? É verdade?

Não é fácil, de facto, cativar os mais jovens para a música e a dança tradicionais portuguesas… Tem a ver com o passado, naturalmente, com a associação do folclore às décadas de ditadura, mas também com a valorização cada vez maior do que vem de fora e do mundo urbano. É música em inglês? Já ganhou um ponto para ser cool… Mas isto é só uma visão das coisas. Há cada vez mais jovens a tocarem instrumentos tradicionais, e alguns destes instrumentos tornaram-se mesmo moda: as gaitas de fole estão “na berra”; bombos, caixas e adufes fazem as delícias de muitos jovens; as concertinas, apesar de terem culpas no cartório relativamente à perda de importância de outros instrumentos musicais tradicionais, levam o som da música tradicional às festas e romarias, onde se encontram centenas de tocadores, muito deles bem jovens; os cordofones tradicionais começam a surgir nas mãos dos mais novos. Por outro lado, na dança, há ainda locais onde todos, novos e velhos, se encontram para dançar as danças da terra. Alguns destes desenvolvimentos devem-se a apostas locais na educação e na integração dos saberes tradicionais nos currículos nacionais. Outros são fenómenos mais livres e autónomos. Muitos devem-se à influência de grupos e associações locais que tentam preservar o património local e acabam por quebrar preconceitos nas comunidades em que se inserem: muitos dos que dançam viras aos domingos em Arcos de Valdevez fazem ou fizeram parte de ranchos folclóricos e grupos etnográficos da região, onde aprenderam a gostar das nossas danças e da nossa música. Já nas grandes cidades a situação é bem mais complicada: há nichos de jovens que procuram, ouvem, fazem e/ ou dançam música de cariz tradicional, mas o preconceito é generalizado e a música anglo-saxónica tem supremacia absoluta.

– Qual o sentido dos estudos etnográficos num mundo em que os diferentes povos vão apagando aos poucos as suas singularidades?

Tanto se apagam as singularidades como as proximidades mais ancestrais entre povos… A nossa cultura, o nosso património, as nossas crenças e tradições, o nosso folclore são pilares em que assenta a nossa existência enquanto sistema social. Cada vez estes estudos são mais importantes.

– O coordenador local dos aPorto escolheu-a para falar e conversar sobre Etnografia Portuguesa. Que nos vai oferecer?

Foi-me solicitado que falasse um pouco sobre festas e romarias, de uma perspetiva pessoal e, acima de tudo, apaixonada. A diversidade cultural deste meu pequenino país é muito visível no momento da festa, pelo que pretendo dar a conhecer um pouco da riqueza deste património cultural, em que os rituais ancestrais, as crenças arreigadas, as lendas antigas, as expressões populares e tradicionais de música e dança são ainda a essência da celebração. Não vou apresentar um trabalho exaustivo ou uma lista de festas e romarias, antes partilhar algumas experiências pessoais, na expectativa de que a vontade de conhecer as festas e romarias de que falo leve os participantes a voltar a Portugal mais depressa… Afinal de contas, as romarias não se contam, vivem-se, e cada um à sua maneira. Tentarei demonstrar algumas conexões e características comuns entre celebrações que têm lugar por todo o país, falar de algumas especificidades que me interessam ou intrigam mais e dar a conhecer alguns documentos sobre o assunto. À noite, no NEFUP, faremos a nossa “romaria”, comendo, dançando e cantando em conjunto, numa mesa redonda a lembrar a serra d’Arga e o seu S. João…

 

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