Entrevista a Tiago Alves

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Através Editora continúa coa publicaçom de autores lusófonos muito vencelhados coa Galiza, como já fixera o ano passado com o escritor angolano Ondjaki.

Este ano o escolhido é o poeta portugués Tiago Alves Costa, que publica o seu poemario ‘Mecanismo de emergencia‘ (Através editora, 2016) e que mora na Galiza desde há uns anos.

Esta quinta-feira 6 de outubro, será apresentado na livraria Chan da Pólvora de Compostela (s. Pedro, 74) às 20h30 horas, o livro Mecanismo de Emergência, polo seu autor Tiago Alves Costa e o poeta Gonzalo Hermo.

Xosé Antom Serem, da Através Editora, entrevista-o para o PGL.

 

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-Que fai um rapaz coma ti publicando num sitio coma este (Através)?

Eu quase me atreveria a inverter a pergunta: o que faz uma editora como a Através publicando um rapaz como eu? Esta pergunta é pertinente por desconfiar daquilo que escrevo. Fazer parte da casa da Associação Galega da Língua, casa de tão nobres causas, é um enorme orgulho e ao mesmo tempo uma responsabilidade. Poder estar ao lado de nomes como Teresa Moure, Carlos Quiroga, Carlos Taibo, Susana Arins ou Ondjaki é sentir que piso sob um caminho firme, um caminho de intensidade poética, intelectual e de resistência à inércia deste nosso mundo, ainda que ao mesmo tempo me faça sentir muito pequeno…

-Que relação tes coa Galiza? E com Portugal?

Uma relação de afecto, de carinho e também de constante redenção. Aqui me descobri e me descubro, em vários âmbitos da minha vida. Por isso mesmo considero esta terra, a Galiza, muito especial. Considero-a, poderei afirmar, o meu outro País, a minha outra Pátria. A outra é Portugal obviamente. Um País que hoje mesmo à distância conheço muito melhor do que conhecia há uns anos atrás, e curiosamente, foi a Galiza que me ajudou nessa espécie de epifania.

-Conheces algo da poesia galega atual? Que diferenças e semelhanças destacarias co ambiente literário português?

Conheço bastante bem a poesia galega actual. Uma poesia que leio e que me entusiasma muito. Acho que não exagero ao colocá-la como uma das melhores poesias que se escreve actualmente na Europa e no mundo. É uma linguagem avançada, com uma profunda consciência cívica, trabalhando sobre o território do novo, da experiência, da imprevisibilidade, contra-poder, nunca perdendo o azimute sensível da sua matriz, é uma poesia que enriquece a realidade, com uma dor-serena que me agrada muito. E para mim é um prazer e uma aprendizagem também poder conviver com uma geração de poetas tão fecunda como é a galega.

Em relação aos ambientes literários portugueses e galegos não sinto muitas diferenças. São ambientes que se movem por contextos históricos/sociais/políticos muito semelhantes. Infelizmente não estão tão próximos como deviam estar, talvez por existirem algumas barreiras que nos são impostas e nos impedem uma aproximação mais profunda. Mas acho que se começam a criar laços para que esta união de forças seja uma realidade.
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-Mecanismo de emergência é um poemário que deita uma olhada diferente à vida e a sua cotidianeidade, com sorpresa, com humor…O Tiago brinca muito cos poemas: joga coas palavras (escrevo escravo), cos espaços, coas tipografias, cos significados…

Gosto muito disso que referes e esses são sem dúvida territórios que procuro na minha investigação. Movo-me fascinado pelos pequenos gestos, por movimentos, do nosso quotidiano. Um observador do nada, talvez, que tem a vida como ponto de chegada e partida. O facto de me entregar aos diversos sentidos de uma rua qualquer e ser seduzido pelas suas personagens (eu sou uma personagem também), pelos seus acontecimentos que fazem desalinhar o universo, pelas suas rotinas, pelo polícia que com as mãos sobre o motor testa o limite legal de estacionamento de um carro, pelos gritos que ninguém ouve, as ânsias, os desejos, que se formam e se desfazem numa elegante e calma tragédia. Mas quanto ao Mecanismo de Emergência ainda me é difícil falar. Ainda não consigo ser o outro, ainda não estou suficientemente afastado dele para o poder interpretar…

-Os tempos atuais são fecundos para a poesia?

Todo o tempo é fecundo para a poesia. O que entusiasmava Safo, ou Rosalía de Castro, por exemplo? A nós tocou-nos viver este tempo, um tempo com traços trágico-cómicos, de cansaço (apesar de corrermos muito), o tempo do medo, sim, por incrível que pareça temos muito medo. O tempo da ignorância (e já soubemos tanto), o tempo em que a mentira e a verdade saem à noite para jantar juntas (tão amigas elas são).

É sobretudo um tempo que sob as suas costas trás o peso de todos os outros tempos vividos. O que nos faz pensar que somos hoje mais avançados que uma pessoa que viveu há 200 anos atrás? Por termos  um smartphone? Ou uma conta no twitter? Ou até um carro com sensor de chuva?

Porque temos hoje tantas certezas e tão poucas dúvidas? Não seremos afinal filhos de um tempo demasiado passado?  A poesia, e hoje mais que nunca, está aí obviamente para revigorar a realidade, para recriar o mundo, o mundo tacitamente comum, a forma mais radical de liberdade é da ordem do poético; pensar poeticamente é hoje desencadear uma série de forças contra a normalidade que secreta e silenciosamente vive no andar de baixo de nossa casa.

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