Jon Amil: «Quero umha Galiza na qual a gente nom pense que vou dançar se digo que “vou mover a cadeira”»

Jon Amil é um viguês a acabar os estudos de Medicina. Está a preparar o trabalho de fim de grau e estuda para o exame MIR. Foi aluno de português na EOI de Compostela e hoje tem um blogue pessoal (As MIR e unha noites) onde apresenta curiosidades e notícias relacionadas com a medicina, para além de colaborar em muitos projetos na Internet.

Jon, tu procedes de umha família metade basca e metade galega. Qual foi o teu relacionamento com a língua? Como chegaste ao galego?

Dadas as circunstâncias, ninguém podia ter previsto que eu acabasse sendo galegofalante. A minha mae, orgulhosa irundarra, veu à Galiza pouco antes de eu nascer, e o seu conhecimento prévio de galego era nulo. Na minha casa a língua era o castelhano.

A escola nom equilibrou a balança do bilinguismo. Na educaçom infantil o galego nom existia. Quando chegou o primeiro ano de educaçom primária, a mestra perguntou “¿Cuántos de vosotros sabéis gallego?”. Ninguém levantou a mão. Es… ta desoladora estatística foi a desculpaperfeita para nom usar o galego nos dous anos que estivemos com ela. A mestra de terceiro e quarto de primária ensinava-nos cousas como que “el Miño nace en Fuente Miña” ou que o galego era um dialeto. A mestra de quinto e sexto substituía as horas de língua galega por horas de leitura em língua castelhana. Vigo é assim.

Se aprendim galego foi por conta própria. Por umha parte, tinha a aldeia, onde ia aos fins de semana, e o galego era a língua habitual. Por outra, tinha a TVG. O Xabarín Club foi quem de fazer que nós, crianças alheias ao galego, cantássemos Vai sendo hora de ir para a casa… cada tardinha quando tínhamos que voltar do parque onde brincávamos.

Afortunadamente quando cheguei à puberdade e ao liceu, as cousas mudárom. Na ESO o galego ganhou presença, ainda que sem chegar ao mínimo de 30% das matérias que  daquela estabelecia a lei. Comecei a ter curiosidade, a pensar sobre as cousas, a duvidar de tudo o que tinha por certo até entom. E cheguei à pergunta mágica: Por que eu nom falo galego? E ainda que ao princípio procurava desculpas, a pergunta era uma comichom que tinha dentro, e que nom acabou até que com 18 anos dei o passo. E desde entom sou um orgulhoso neofalante.

Como deste o passo para o reintegracionismo? Qual foi o antes e o depois?

Jon, numha participaçom no programa ‘Tourilândia’ da TVG

Para mim a ideia de galego e português serem a mesma língua sempre foi natural. A minha família paterna provém dumha pequena aldeia do Condado, e minha avó usa palavras como batata, ervilha, ouvir… com total normalidade. Além disso, na aldeia recebíamos o sinal dos canais de TV portugueses, e de pequeno via os desenhos animados da SIC sem problema (é que em Pokémon iam por diante da emissom espanhola, e assim sabia o que ia acontecer na série antes que os meus amigos). Quando fum crescendo, sempre tivem a sensaçom de que em Portugal falavam coma/como nós, só me faltava a questom ortográfica. Por desconhecimento, tinha a ideia de que o português derivava do galego medieval, e que no galego medieval a ortografia era como a da RAG, e portanto os portugueses deviam adotar a nossa ortografia.

Quando já era rapaz, na minha etapa de pensar sobre as cousas, via por Vigo pintadas do tipo Na Galiza em galego!. E eu perguntava-me Porque escrevem entom em português? Mas na era pré-Internet (nom tivem conexom na casa até os 18) era difícil saber as respostas a essas perguntas. E foi com 17 anos quando num manual escolar de galego, ao falar das siglas, aparecia entre outros exemplos a AGAL (Associaçom Galega da Língua). E perguntei ao professor que porque se eram umha associaçom galega escreviam o nome em português. Entom explicou-me que nom era português, que era galego reintegrado, ao que acrescentou Non son moitos, pero fan moito ruído. Daí entrei no PGL do computador da casa dum amigo, comecei a ler artigos e pdf que havia na zona de descargas… e convenceu-me. Concretamente foi num artigo, o argumento das famílias léxicas, com o exemplo de Bélxica -> Belga, o que me fixo concordar. E comecei a praticar, a fazer as minhas anotaçons pessoais em reintegrado… e até hoje.

Tens um blogue pessoal, As MIR e unha noites, e és colaborador de outras webs como Memoria Pixelada (sobre videojogos), onde o galego é a língua de uso. Qual achas que é a presença do galego destes âmbitos na rede? E como está a ser acolhido polo público internauta?

O galego na Internet, como na vida real, está mal. Bem é certo que existe umha comunidade mui ativa que fai muitos esforços, mas polo geral o galego é tido como umha língua de segunda. A gente, por costume ou inércia, recorre sempre ao castelhano. Umha vez umha amiga minha necessitava umha informaçom sobre umha localidade galega, e veu-me pedir ajuda porque “nom aparece na Wikipédia!”. Para ela, a versom hispanófona da Wikipédia era A Wikipédia. A informaçom que ela procurava estava lá, tanto na versom em galego RAG como na versom em português, mas nem sabia da sua existência.

Também acontece com os jornais digitais. Tenho amigos galegofalantes que preferem ler as notíciasem meios de comunicaçom em castelhano, porque pensam que os jornais em galego, por estarem em galego, nom som sérios. E já sobre a qualidade linguística do galego que se usa na Internet nom vou falar, que bem dá para umha tese de doutoramento.

Estás a acabar os teus estudos de Medicina mas continuas ligado à faculdade. Qual achas que é a situaçom da língua galega entre os colegas da faculdade? Qual é a implicaçom do professorado de Medicina com o galego?

A dia de hoje, na única faculdade de Medicina da Galiza, as aulas em galego som totalmente residuais. Pode variar segundo a promoçom, mas na minha só tivem três professores que falassem na nossa língua. Vaia, quatro se contamos um que nom nos deu mais que três ou quatro aulas de umha hora. Tendo em conta que, de modo geral, temos uns quatro professores por matéria e umhas dez matérias por ano, num total de seis anos… que percentagem representa isso? 5%, sendo generosos? Sim, bem é certo que nós, estudantes, podemos escolher em que língua responder os exames, mas dado que em Medicina som quase todos tipo teste, a nossa escolha reduz-se a marcar a resposta com um xis ou com una equis.

Lembro um caso peculiar. Um dos professores dixo no primeiro dia de aulas que nom ia falar em galego para que as estudantes que vinham de Portugal nom tivessem problemas de compreensom. Ou seja, segundo ele as portuguesas nom iam entender o galego. Curiosamente esse mesmo professor recebeu há pouco um galardom internacional polo seu trabalho em prol da cultura lusófona. Cousas da vida.

Entre as minhas colegas, a cousa é algo melhor. Quase metade falam galego, tanto nas aulas quanto no hospital. Mas a triste realidade é que depois, à hora de escrever histórias clínicas ou cousas do estilo, recorrem quase na sua totalidade ao castelhano, em muitas ocasions por serem incapazes de usar a linguagem médica em galego. Se nom dérom aulas em galego na faculdade, como vam saber as palavras técnicas na nossa língua?

Que é o que esperas da AGAL?

Da AGAL só espero que seja quem de chegar à gente. Afortunadamente nos últimos anos estou a ver que a AGAL está mais virada para isto, mas ainda há muito a fazer. Temos que conseguir que a gente conheça o reintegracionismo, que sejam capazes de ler nesta ortografia sem dificuldade, e que o vejam como algo normal. Para isto é preciso muita pedagogia e muita mão esquerda, mas acho que a AGAL está no caminho certo.

Também espero que a gente da AGAL nom enrede tanto a responder entrevistas como eu, que isto mais que umha entrevista vai parecer O Senhor dos Anéis em versom estendida.

Como gostarias que fosse a “fotografia lingüística” da Galiza em 2030?

Quero umha Galiza onde as crianças e a rapaziada falem galego com normalidade. Umha Galiza dona de si que se relacione em todos os âmbitos com o resto da Lusofonia, com voz própria. Umha Galiza na qual quando diga “vou mover a cadeira” a gente nom pense que me vou pôr a dançar.

 

Conhecendo Jon:

  • Um sítio web: Os Arquivos da Meiga
  • Um invento: O teletexto
  • Umha música: Está que é nana, naná na, na na na… Sabes qual che digo?
  • Um livro: Só um? Mmm… The Hitchhikker’s Guide to the Galaxy
  • Um facto histórico: A destruiçom da Estrela da Morte (é histórico, aconteceu há muito tempo numha galáxia mui, mui distante)
  • Um prato na mesa: Leite com bolachas, especialmente se as bolachas tenhem forma de dinossauro
  • Um desporto: Correr atrás do bus, porque sempre chego tarde à paragem
  • Um filme: Pulp Fiction, na sua dobragem galega
  • Umha maravilha: Acochar-te na cama ao quentinho enquanto ouves como fora está a chover mui forte
  • Além de galego: Além de galego, basco. Aquém de galego, pessoa

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