Germám Ermida, trabalhador no Conselho da Cultura Galega e profissional da Banda Desenhada

Valentim R. Fagim – Germám Ermida orgulha-se de nom ser filólogo, trabalha no Conselho da Cultura Galega, foi um contumaz anti-lusista, acha que uma nova História da Língua teria mais sucesso que a sua matriz e está pola açom construtiva no reintegracionismo.

És neo-falante e um orgulhoso nom-filólogo, nom é?

Som. O de neo-falante nom é cousa de especial orgulho, é o que há. Antes bem orgulha-me quando a gente se surpreende de que o seja ao me escuitar falar. E o de nom-filólogo, a verdade é que numha cidade como Compostela às vezes sinto que todos os reintegracionistas som filólogos, e nesse sentido sim que me parece importante que haja gente doutros ofícios. Sem problema nengum com os filólogos, que fique claro.

Fizeste parte do MDL, que lembranças guardas dessa etapa?

Entrei ao pouco da experiência da Assembleia da Língua, num momento no que o MDL estava a colher muita força. Foi umha grande experiência, com muitos projetos e esperanças, e gente estupenda. Iniciativas como o Fórum da Língua, os bookcrossing ou os primeiros movimentos a prol das Tvs portuguesas na Galiza seguiam umha linha de açom construtiva da qual gostei muito. Em geral acho que aquele trabalho de base e dos esforços por conseguir umha certa unidade de açom do reintegracionismo deixou um pouso do que ainda hoje vemos resultados. Em geral, a proposta de trabalho naquela altura concordava muito com a minha experiência prévia na Assembleia ENE AGÁ de Ponte Vedra, e acho que AGAL agora está a manter umha linha muito semelhante com a que estou a gosto.

Chegaste ao reintegracionismo por reaçom. Poderias explicar-nos como?

Nos tempos do liceu, durante umha greve, peguei num panfleto dos Docentes contra a Repressão Linguística. Naquele momento eu estava de modo visceral contra o reintegracionismo e pareceu-me algo totalmente errado. Quando pouco depois um professor falou de maneira positiva da opçom lusista fui aonde ele a pedir-lhe documentaçom ao respeito, convencido de que era um despropósito.

Li entom um livro da AS-PG que pulava polos mínimos e falava brevemente dos máximos. E decatei-me que eram os máximos a aposta mais coerente e lógica. Desde aquela vam lá mais de quinze anos, e cada vez tenho menos problema com a integraçom direta no estándar internacional da nossa língua.

És profissional da Banda Desenhada. Como está a saúde da BD galega? Seria possível repetir um produto como a História da Língua e da Galiza em BD?

A BD galega está num momento verdadeiramente interessante. Nos últimos dez anos houvo mudanças mesmo destacadas para bem, embora mais lentas do que gostaríamos. Nesta altura estamos num momento de transiçom onde, depois dessa explosom de prémios, autores que dam o salto à publicaçom e o reconhecimento público do setor, continuam a se dar passos de cara à consolidaçom dumha mínima indústria cultural. Vam nascendo editoras e novas iniciativas, e embora as políticas públicas ao respeito estejam a sofrer umha acusada paragem, as perspetivas som positivas de cara ao futuro. Tal e como estám as cousas, nom só um produto como a História da Língua ou da Galiza seriam possíveis, se nom que quase qualquer produto poderia sair cumha possibilidades de êxito bem superiores às daquele momento. A diferença fundamental é que se naqueles primeiros noventa eram lançamentos marginais e quase únicos, hoje estariam inseridos numha produçom cada vez maior de BD de autores galegos. Em todo o caso, a questom é atopar autores com o tempo e o compromisso avondos, público estou certo que há mesmo mais do que naquele momento, tanto no reintegracionismo como fora.

Estudas Antropologia social e cultural, que áreas som as que mais te seduzem?

Realmente entrei na Antropologia da mao dos trabalhos de Marcial Gondar a analisar a mudança social na Galiza, e compreender esse processo continua a ser para mim um foco de interesse destacado. A perspetiva antropológica parece-me fundamental para entendermos a realidade, e em particular os problemas da globalizaçom, a emigraçom, a construçom de identidades e a transformaçom da cultura popular. Nesse sentido a Antropologia Urbana e as análises sobre associacionismo e novas formas de sociabilidade parecem-me fascinantes e ajudam-me a compreender melhor a minha própria experiência vital.

Tens estado em vários países com quem compartimos a língua. Como correu a experiência do ponto de vista comunicativo e de contato com as suas culturas?

Realmente a minha experiência com a lusofonia é fundamentalmente em Portugal, e em geral atopei reações de surpresa ao facto de eu explicar que falo a mesma língua do que Além Minho. Depois da surpresa inicial, a experiência foi sempre altamente positiva, embora fique sempre a mágoa desse desconhecimento. Recentemente conhecim vários brasileiros em Nova Iorque, todos eles titulados universitários que ficavam altamente surpreendidos ao lhes dizer eu que a nossa língua comum nascera cá na Galiza. Lá nom figem esforço nengum por adaptar nem o meu sotaque nem o meu vocabulário, e eles ficavam verdadeiramente encantados com o bem que falava português. Nom esquecerei esse momento no que dixem “cuidado que está o semáforo em vermelho” e um respondia “entom, dizem vermelho também? É incrível!”. No entanto, a experiência que guardo com mais carinho é o ter atopado no Brasil algum fiel leitor do meu blogue, e sentir-se profundamente compreendido por alguém do além do Atlántico a quem nunca se viu mas com quem se comparte língua e umha certa sensibilidade.

Por onde deve caminhar o reintegracionismo e/ou o movimento normalizador? Que se está a fazer bem? Que achas em falta?

Acho que em geral está a se percorrer um caminho muito positivo. Deixárom-se atrás polémicas pouco produtivas e o reintegracionismo está a seguir um caminho de açom construtiva, com campanhas como a do ensino do português, as Tvs ou o reconhecimento internacional da nossa realidade lingüística. Nesse sentido adoro iniciativas como o Ops, o Portal Galego da Língua e os seus incríveis recursos em linha e, como nom, o importante trabalho da Academia Galega da Língua Portuguesa, que complementa estupendamente o de organizações como AGAL. Acho que estamos a chegar a níveis inéditos para o nosso movimento. Como eivas, considero que continua a falhar certa unidade de acçom no movimento normalizador, independentemente da opçom ortográfica. Nom penso que seja atribuível ao reintegracionismo nem as suas organizaçons, mas a realidade é que continuamos a ficar, ou nos deixam ficar, num certo nicho nesse sentido.

Pensas que a visom global da nossa língua está a penetrar no discurso e nas práticas?

A seguir com o razoamento anterior, nom deixa de me surpreender como, desde que entrei no movimento reintegracionista, por vez primeira atopo discursos em organismo oficiais e em pessoas nada suspeitas de reintegracionismo, afirmando a unidade lingüística de galego e português. O apoio público à candidatura do Património Imaterial Galego-Português, a reclamaçom da Tvs portuguesas no Parlamento e mesmo no Congresso, os acordos do Conselho da Cultura e da Junta com o Instituto Camões som passos que deixam claro que o nosso discurso, inevitavelmente, está a calhar na sociedade. E som movimentos e declaraçons que há anos eram impensáveis. Acho que se está a dar um certo relaxamento no confronto histórico em volta da língua no país, e isso é positivo porque permitiu umha certa abertura no isolacionismo. A questom agora é que todos estes movimentos nom se vem polo de agora acompanhados de propostas efetivas de reforma ortográfica, mas acho inevitável que continuem os avanços nesse sentido.

Que visom tinhas da AGAL, por que te associaste e que esperas da associaçom?

Quando comecei no reintegracionismo AGAL era um referente que, no entanto, às pessoas que trabalhávamos nos grupos de base locais, tornava-se algo afastado da nossa linha e mais centrado na análise e na construçom da normativa. Nos últimos anos vejo umha AGAL muito mais ativa e aberta, com um trabalho de base muito superior a tempos anteriores. Associei-me porque me decatei de que em geral a linha de trabalho coincide de novo com a que eu gosto. Aguardo que o caminho continue e que iniciativas como o manual Do Ñ para o NH, o Ops e outras propostas de popularizaçom tenham continuidade. Aliás, gostava que a associaçom desenvolvesse um papel cada vez mais destacado na rua e na organizaçom de todo tipo de eventos e foros, sempre com essa visom construtiva que está a caracterizar o nosso movimento nos últimos anos, e tirando ao reintegracionismo esse certo pouso de movimento para eruditos que ainda poderia ter em certas partes da nossa sociedade.

Conhecendo Germám Ermida


  • Um sítio web: Google.
  • Um invento: Deveria dizer a penicilina, mas ultimamente acho que é o Spotify o que me dá mais alegrias.
  • Umha música: Buf. Direi Beirut e Caetano Veloso, por dizer algo.
  • Um livro: Também é muito difícil. O Simbad do Cunqueiro, embora suponho que ler O Senhor dos Aneis com 12 anos deixou-me mais marca do que qualquer outro livro.
  • Um facto histórico: A II Guerra Mundial exerce sobre mim umha fascinaçom um tanto friki.
  • Um prato na mesa: O polvo.
  • Um desporto: O tai chi é boníssimo para tudo e mudou-me a vida, embora nom pense que se lhe poda chamar desporto 🙂
  • Um filme: La fille sur le pont, por dizer algumha cousa.
  • Umha maravilha: Ultimamente maravilho-me imenso com a gente toda que me rodeia, com os momentos que compartimos e com a descoberta de novos amigos.
  • Além de galego/a: procuro ser boa pessoa.

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