Joám Facal: «Umha adequada formulaçom da proposta reintegracionista ao conjunto da sociedade nom consiste em dizer simplesmente: ‘bom aí tenhem vocês o português, e pronto’»

PGL– Joám Facal toca piano e ama as árvores, é viciado da economia, acha que os 2000 som do Brasil e que os essencialismos de toda casta som umha desgraça, umha estéril militáncia no desvario. Adorou a sua experiência nos aPorto e afirma que nom podemos perder tempo.

Portal Galego da Língua: Joám Facal, segundo fontes reservadas, dedica os fins de semana a trabalhar no monte, escutar música clássica e ler.

Joám Facal: Assi é e assi será. Nascim e vivim na aldeia até os quinze anos, Toba, ao pé da ria de Corcubiom, frente ao Pindo. O trabalho na terra e a paixom polas árvores fai parte da nossa cultura familiar. A leitura e a música som dous caminhos reais para aproximar-nos disso tam desconcertante e fugaz que chamamos vida. Um diálogo com os mestres da humanidade.

PGL: Joám Facal é um reputado economista, firme partidário da euro-regiom Galiza/Norte de Portugal. Que peso tem a economia na criaçom de identidades?

JF: Figem-me economista despois de engenheiro e aí desenvolvim a minha atividade profissional até o momento de me reformar. A economia é ademais um vício particular: ler atentamente e tentar compreender a informaçom económica cotidiana, ter sempre sobre a mesa um livro de economia. Fago parte também de algumha equipa coletiva, nomeadamente o CIEF (Centro de Investigaçons Económicas e Financeiras), onde levamos 25 anos analisando sem interrupçom o desempenho da economia galega ou os foros anuais sobre economia galega organizados pola Fundaçom Pérez Rumbao. Colaborei em dous livros sobre a euro-regiom, um deles publicado polo CIEF em colaboraçom com a Universidade Católica do Porto e outro pronto a sair. A euro-regiom é umha área incontornável para o desempenho económico da Galiza; fai parte já do nosso mercado interior ainda que enfraquecido pola crise. Além disso, é o espaço da Galiza histórica tam viva ainda nas modalidades idiomáticas da Regiom Norte.

PGL: Brasil já está na cena internacional, e com os eventos desportivos do Mundial e as Olimpíadas ainda o vai estar mais. A cidadania galega olhará mais para o Brasil? Olhará mais para a sua/nossa língua?

JF: A dimensom brasileira é inevitável desde o ingresso do Brasil no seleto grupo de grandes economias emergentes, junto da Rússia, a Índia e a China. Brasil leva caminho de ser por fim o país do futuro que prometia e isso vai potenciar o seu atrativo. Se a isto somamos a contagiosa paixom musical e a criatividade brasileira, que a mocidade sabe apreciar tam bem, o protagonismo de Brasil está assegurado. Seguido prestes por Angola, talvez. “Menos mais que nos queda Portugal” diz-se; podemos acrescentar: “Os dous mil som do Brasil”.

PGL: Logo que reformado, começaste a estudar português na EOI de Santiago. Era algo que estava pendente? Recomendarias a outras pessoas passarem pola EOI?

JF: Era umha matéria pendente no meu curso vital, como é a elaboraçom de umha tese sobre economia galega e o estudo de piano. A vida é tam breve que hai que tentar vivê-la de todas as maneiras possíveis, como Pessoa queria. Novas perspetivas, novas amizades, novas experiências. Eu convido toda a gente a estudar português, porque é nosso, útil, aprazível para a leitura e a conversaçom. Além disso, o quadro docente da EOI é ótimo, cordial e entusiasta. Quem pede mais?

PGL: O nacionalismo galego tem claro que a Lusofonia reforça a naçom galega e a nossa língua? Que peso tem ainda o essencialismo?

JF: Língua e política, política lingüística, modelos de normalizaçom… muita matéria para responder decontado. O português é, simplesmente, a dimensom internacional do galego. A prática de Camilo Nogueira no Parlamento europeu é concludente a tal respeito.

Porquê entom tanta resistência a promover atitudes pró-ativas e abrir a tarefa do diálogo social? Há medo à incompreensom social, e há medo e medo. Devemos reconhecer também que os primeiros povoadores da ínsua AGAL nom eram tampouco a interface mais cordial para abrir um debate racional e sossegado sobre um tema tam delicado como o das identidades linguísticas. E está, sobretudo, a auto satisfeita assimetria blindada entre os aderentes à política lingüística oficial frente à inóspita independência em que sobrevivem os convictos da orientaçom reintegracionista.

Nom esqueçamos que Carvalho é ainda um proscrito da cultura galega oficial. Questons tam decisivas para o futuro do galego como o estabelecimento de departamentos comuns de galego-português a partir da escola primária, a recepçom da TV em português, o intercámbio de estudantes, científicos e agentes culturais, a exploraçom cultural da lusofonia, ficam excluídos em espera de um consenso cívico e político que ninguém se atreve a promover. Estou certo de que o egrégio Padre Sarmiento seria hoje partidário do ensino do português. É questom de ilustraçom e abertura ao futuro. Os essencialismos de toda casta som umha desgraça, umha estéril militáncia no desvario.

Joám Facal e a sua companheira, Ana

PGL: Como se poderia introduzir a estratégia luso-brasileira-angolana na agenda política?

JF: Bom, ante todo está a questom de umha adequada formulaçom da proposta reintegracionista ao conjunto da sociedade que nom consiste em dizer simplesmente: bom aí tenhem vocês o português, e pronto.

Tentar superar o marasmo em que sobrevive o idioma passa por brigar em contra da valencianizaçom do galego, por vindicar das formas cultas frente à degradaçom imparável da fonética e sintaxe, tam evidente já nos médios e no uso. A questom que se coloca é: Que política linguística e educativa? Que norma ortográfica?

Na minha opiniom, o modelo de reintegraçom poderia aproximar-se ao do neerlandês frente ao alemám, como já apontara Carvalho. Devemos prevenir-nos, em troca, de cair em práticas lingüísticas subalternas no estilo do spanglish chicano, em versom galusa. A sociedade galega nom o entenderia. Galiza tem um importante papel a desempenhar no dilatado ámbito da lusofonia lingüística, reforçando a singularidade das falas do Norte e defendendo o tesouro do galego vivo. De Portugal a norma e o modelo, da nossa própria sociedade a coloquialidade, a expressividade, o uso descontraído, o rechaço da artificialidade e a pose lisboeta. O processo reintegracionista nom pode esquecer a dimensom social do problema, o da briga pola aceitaçom e a difusom das boas práticas lingüísticas; qualquer outra atitude implica dar por resoluto o imenso desafio da pedagogia social.

PGL: Desde quando achas que “menos mal que nos queda Portugal”?

JF: Para mim é umha velha evidência. Como gostariam bascos e cataláns terem os seus Torga e os seus Pessoa, poderem praticar o idioma próprio como idioma oficial normalizado, viajar ao Rio ou a Luanda na língua ancestral. Andar Portugal é revisitar Galiza. Quando eu vou de Braga a Bouro (Boiro), passo por Goiães (Goiáns, Goiás) e também por Verim! Revejo o meu próprio país, como num espelho brilhante.

PGL: Joám Facal tivo um intenso passado sindicalista nos anos 70. Achas, como o presidente da RAG, Xosé Luís Méndez Ferrín, que o reintegracionismo tem que predicar à porta de Citroën? Onde tem que predicar em tua opiniom?

JF: Política, sindicalismo. Quando o presidente da RAG fala de predicar à porta de Citroën comete um reconhecível lapsus freudiano ao resgatar da memória umha descalificaçom procedente das polémicas grupusculares na sua pretensom de interpretar/interpelar às massas. As questons de política lingüística remetem-nos ao avesso destas atitudes, ao consenso social. Como qualquer outra proposta de construçom nacional.

Onde predicar?: talvez às portas de umha sala de discusom franca e descontraída presidida por umha única ordem do dia; o desenho de umha política lingüística no meio prazo, capaz de abrir o idioma secular partilhado à dimensom internacional sem sacrificar a fidelidade dos utentes habituais. Galiza espera açons presididas ao mesmo tempo pola prudência e a audácia. Eu nom perdo a esperança. Ferrim gosta da surpresa e em tempos praticou a ousadia. Na prédica que esperamos devia haver muitos oradores convocados; nom somos tantos enquanto continua crescendo o deterioro e a desídia.

Um único horizonte deveria congregar-nos: substituir a disjuntiva condenatória: ou galego ou português polo cultivo do campo fértil do continuum lingüístico galego-português. A razom acabará impondo-se, a problema reside em nom perder tempo. Nos usos sociais, as perdas som, com freqüência, irreversíveis.

No centro, Joám Facal numha conferência
sobre as deslocalizaçons empresariais

PGL: Por que te decidiste a te associares a AGAL agora, sendo como és um reintegracionista convicto há anos? Que esperas da associaçom?

JF: Bom, a necessidade da prática reintegracionista é umha evidência que coexiste para mim sem trauma com a minha querença irrenunciável ao galego vivo e à prioridade no seu uso qualquer que seja o formato ou a ortografia. Nom tolero condenas de partisanos ou académicos nestas questons. O galego é o meu idioma de instalaçom e o da minha família e o seu futuro deve jogar-se no campo da liberdade de opiniom cívica informada e nom em concilábulos de oficiantes e profissionais da re linguística.

AGAL tem feito contributos mui importantes à cultura galega muitas vezes baixo o fogo aberto da animadversom oficial e social. Atitudes de coragem capazes de sobrepor-se a côdea de condescendência habitual impulsárom o modelo Burela, estám organizando os magníficos mini cursos de inmersom em português para galegos no Porto, elaborárom manuais de aprendizado de língua, estilística e traduçom, multiplicárom os contactos com a cultura de fala portuguesa. A normalizaçom das minhas convicçons tem a ver talvez com um maior sossego vital e desapego pola opiniom alheia. Os anos confirmam convicçons e lealdades, dotam-nos de maior liberdade, fam-te, em definitiva, mais livre.

PGL: Achas que mudou o reintegracionismo? Em que medida?

JF: Percebo a AGAL atual menos dogmática e mais próxima sem prejuízo da firmeza e o empenho. Mais acolhedora, penso, para defender opinions matizadas sobre os tempos e os modos da estratégia de reintegraçom na procura de consenso social. A assistência neste verao ao curso de imersom em português no Porto foi para mim umha experiência marcante, além de mui gratificante, acerca da discreta eficácia de gente como o Valentim. Tenho, aliás, dous queridos sobrinhos na AGAL e bastantes amigos, algum de velho, assi que talvez era o momento. Quadrou, como se diz.

Conhecendo Joám Facal


  • Um sítio web: Como economista freqüento o INE, BE, Eurostat, FMI… como cidadao do mundo, o universo Google, as Wiki, os curtos musicais do Youtube…
  • Um invento: Como engenheiro, a roda, a junta cardám, o motor de explosom, a turbina… como cidadao, a penicilina, a Internet, a imprensa, os médios de reproduçom musical.
  • Umha música: A Paixom segundo Sam Mateu de Bach, os quartetos e quintetos de Mozart, o dom Giovanni, Beethovem, Brahms, Bartok, Shostakovitch… Sei lá, como dim os portugueses.
  • Um livro: A Biblia, As mil e umha noites, O livro do desassossego, as histórias de Cunqueiro, tantos poetas…
  • Um facto histórico: As viagens que mudárom a história: as de Saulo polo Mediterráneo, a de Napoleom por Europa até Moscovo, a de Darwin no Beagle.
  • Um prato na mesa: Empada de broa com xoubas, um cozido em ordem, bacalhau em guiso à moda da minha casa. O mencia pode ser um bom companheiro de mesa sem desprezar o tempranilho que seria blasfémia.
  • Um desporto: Andar monte, andar cidades com história com um livro na mao.
  • Um filme: Tantos… vou citar três à toa: o desencanto da política, “A vida dos outros”; a coragem contra a adversidade: “Só ante o perigo”; a nostalgia da terra e do amor: “O home tranquilo”
  • Uma maravilha: A duas que inquietavam Pascal: o mistério da matéria e o mistério do Universo.
  • Além de galego/a: Europeu convicto, irmao da humanidade esmagada, adito aos gigantes que nos precedêrom e nos orgulham de sermos humanos.

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