Olivia Pena é galega nascida em Oviedo, preocupa-lhe velhos esquemas em pessoas novas, reside em Carvalho onde é fácil nadar no galego. Tem um fraquinho polo teatro. Leciona, no sistema público, galego e português. Pudo mostrar o seu lado escuro da norma, à vontade, na faculdade de Filologia da Corunha. Acha que a única possibilidade de futuro do galego é o reintegracionismo, voltar às origens.
Olivia nasceu, por acaso, em Oviedo, de pais galego-falantes. No entanto, a língua de transmissão familiar foi o castelhano. Como observas esse facto na distância temporal?
Observo-o como algo episódico, especialmente porque toda a família era galego-falante e eu cresci imersa nesta língua, apesar de os meus pais nom no-la falarem directamente.
Até que ponto sentes, e observas, que as gerações socializadas no franquismo têm esquemas fixos, difíceis de mudar?
Eu som capaz de entender que essas geraçons tenham actuado dessa forma, no tocante à língua, porque é difícil fugir à pressom social da comunidade. O que mais me preocupa é ver que as geraçons mais novas, nalguns casos filhos de pessoas que já nasceram em democracia, mantenhem exactamente os mesmos esquemas.
Adolescência, por vezes, é borbulhar, rasgar roteiros e inventar caminhos e decides instalar-te no galego. Como foi o processo, quais as facilidades e quais as dificuldades?
Em Carvalho, instalar-se no galego nom é só fácil como também natural. Nom encontrei nenhuma dificuldade por falar galego, ainda que tivem de ouvir algum comentário sobre o galego que falávamos na universidade, tudo sempre à volta dos preconceitos.
Olivia tem um fraco, ou um forte, polo teatro, com muitas obras publicadas. Que te dá o teatro, que pode dar ao resto das pessoas?
Umha parte importante da minha vida gira à volta dos livros: sempre gostei muito de ler, mas também sempre gostei muito de escrever. Nas minhas lembranças mais antigas, vejo-me já com papel e caneta na mao, com livros. No mundo do teatro entrei só em adulta, e por puro acaso, como acontecem sempre as melhores cousas. Reconheço que foi umha revelaçom no sentido de que, para mim, como para a maioria da gente, o teatro foi sempre mais espectáculo do que literatura. Quando Xesús Pisón se atravessou no meu caminho, isso mudou e deixei-me fascinar por esse género, mas, na realidade, nom podo dizer que me dê algo que nom me poda dar a poesia. Toda a literatura, em qualquer dos seus géneros, pode fazer-nos sentir isso.
Olivia é professora de galego e de português em Carvalho. Qual a receção das tuas turmas a ambas as matérias?
Melhor ao português do que ao galego. Apesar de vivermos numha terra com muitos galego-falantes, isso nom repercute directamente no interesse que o alunado mostra nas aulas: falam galego, mas nom gostam de o estudar, ano após ano. Afinal, o facto de português ser optativa, mesmo com motivaçons muito diversas, ajuda muito nesse sentido.
Em que medida são as variedades de Portugal e do Brasil um reforço para a nossa variedade? Que ações ou políticas achas deviam ser implementadas nesse sentido?
Som um reforço importantíssimo no sentido de que as pessoas podem comprovar que a língua galega nom tem só a ver com o sentimento identitário, mas que tem utilidade de facto, real e tangível. Quanto mais conhecemos as outras variantes, melhor conhecemos a nossa própria. As acçons que há que implementar som as que já existem no papel: só há que fazer o esforço de as trasladar à realidade!
As variantes de Portugal ou do Brasil som um reforço importantíssimo no sentido de que as pessoas podem comprovar que a língua galega nom tem só a ver com o sentimento identitário, mas que tem utilidade de facto, real e tangível.
Como foi a tua passagem para o lado escuro da norma?
Nom existe um momento de passagem, porque sempre estive virada para o lado escuro, ainda que, por questons académicas, primeiro, e depois laborais, fosse difícil manifestá-lo. Nom era como esses maus de filme que tentam todo o tempo parecer dos bons para depois surpreender-nos no fim. Foi só que demorei um pouco a ter a oportunidade de o dizer. Encontrei-na na faculdade de Filologia da Corunha, mas, disso, já há muitíssimos anos!
Porque decidiste fazer parte do navio agálico? Para onde gostavas que rumasse?
Após meia vida transitando o lado escuro e vários anos de proximidade que já é amizade, senti que era o momento. Nom sei para onde deveria rumar, só que nom deve perder o rumo para nom perder a sua essência; que devemos continuar a lutar, porque a única possibilidade de futuro do galego é o reintegracionismo, voltar à nossa origem, assumir o que somos e reconhecer -no sentido mais amplo do termo- as nossas raízes. As únicas. Estamos muito longe ainda e nom digo que nom possa haver uma fase intermédia como o binormativismo, mas acho que nom deve ser o nosso objectivo final.
Como imaginas ou desejas que seja a “fotografia linguística” da Galiza em 2040?
Desejo que, polo menos, nom piore e que, mesmo em situaçom precária, o galego se mantenha. Sem ser perfeito, seria já excelente se o mapa sociolinguístico fosse como é na minha vila agora mesmo. Às vezes, chegas a esquecer-te de que isto nom é o que há aí fora! Quanto ao aspecto normativo, acho que é necessário que a nossa normativa se oficialize.
Conhecendo Olivia Pena
Um sítio web: Ainda que nom fique muito bem, wordpress, porque é onde está o meu blog “a cara oculta da lua”, que é um dos meus refúgios preferidos nas noites de insónia.
Um invento: O ibuprofeno.
Uma música: Posso ouvir até ao infinito o “Take this Waltz” de Cohen.
Um livro: Estou a ler “Cien años de soledad” pola quarta ou quinta vez. Nom existe nenhum outro que me crie esta necessidade de voltar a ele cada certo tempo. É como regressar a casa.
Um facto histórico: O lançamento do Sputnik 2, com a Laika. Ainda que em 1957 eu nem estava perto de nascer, sempre me impressionou muito. Em criança, descobri a história desta cadelita num álbum de cromos -de cans, claro- e fiquei fascinada com ela. Nom lembro se isso foi antes ou depois de ter umha pastora alemá chamada assim.
Um prato na mesa: Qualquer massa, básica, com um simples rustido de azeite e alho, já é boa.
Um desporto: A ginástica, artística e rítmica. Para ver, claro. Para praticar, durante vários anos foi a equitaçom. Agora, conformo-me com actividades aeróbicas.
Um filme: Depende do momento. Gosto muito dos clássicos, por exemplo, e, em geral, detesto todo o que é politicamente correcto. Creio que esse discurso nom faz bem ao cinema.
Uma maravilha: Abstracta, a sintaxe. Concreta, qualquer umha das que demonstram a capacidade do ser humano para construir cousas incríveis, desde que habitamos a Terra. Pirámides, templos, pontes… tudo o que nos faça ficar parados e sentir vertigem ao pensar como é possível que alguém como nós tenha construído isso que nós agora contemplamos admirados.
Além de galega: Filóloga.
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