PGL – Vitória Sánchez Regueiro é galego-falante nativa, filóloga e quando estudava a carreira, achava a AGAL um bando de criminosos. Embora ser professora de galego, no Barco é conhecida como docente de português, um sonho profissional que se tornou realidade nos últimos anos.
Vitória é docente de língua portuguesa no IES Martaguisela do Barco. Que foi o que te levou a dares aulas de português? Que foi o que aprendeste com as aulas?
Eu, que sou galego-falante nativa, não descobri o português até os 22 anos, na Faculdade de Filologia. Ao estudar português, que eu julgava ser um idioma estrangeiro, aprendi muito sobre a minha própria língua, e sobre tudo, descobri que essa língua marginalizada que eu falava, florescia noutros lugares do planeta. Foi aí que fiquei convicta da grande importância que tem estudar e ensinar português na Galiza. Porém, em 1997, ano em que me formei em Filologia Galego-Portuguesa, não existia a mais mínima hipótese de ensinar português na Galiza, foi por isso que optei por ensinar galego.
Em 2006, ao regressar das férias de verão, encontrei no cacifo do IES Martaguisela, onde lecionava galego havia seis anos, uma carta da EOI de Ourense, assinada por Valentim Fagim, onde me informavam da possibilidade de ensinar português. Por fim estava na hora de realizar o meu sonho. Comecei a estudar português novamente na EOI de Ourense e a trabalhar para introduzir a oferta de português no meu liceu. Foram muitas horas de autocarro a viajar do Barco até a EOI de Ourense, muitas disputas com os colegas do liceu que não compreendiam o interesse de ensinar português e até julgavam que fosse danificar alguém, muita papelada e burocracia desnecessária… mas finalmente consegui o que queria e valeu muito a pena.
As aulas de português serviram-me não só para apurar os meus conhecimentos de português, mas também para verificar como os galegos e os portugueses somos parecidos assim nas virtudes como nos defeitos: “dois irmão gémeos presos pelas costas…” Além disso, de dar aulas de português tirei ainda uma grandíssima vantagem que eu nem imaginava: todo o carinho, a amizade e o apoio que sempre me deram os colegas da Associação de Docentes de Português.
Tu dás aulas de língua em diferentes turmas, ora adequando-te à disciplina “Lingua Galega e Literatura”, ora à de “LE Português”: Encontras diferenças na atitude com a língua de parte do estudantado? Quais os motivos?
A disciplina de Lingua Galega e Literatura é comum e obrigada para todo o alunado. A disciplina de LE Português, pelo contrário, é opcional, tanto para o estudantado que a quer estudar como para mim, que a leciono por minha vontade. É por isso que a atitude do estudantado de uma e outra disciplina é bastante diferente.
Surpreendeu-me o facto de, tendo apenas 22 alunos de português e mais de 100 alunos de galego, ser mais conhecida na vila como professora de português do que como professora de galego. O português não deixa as pessoas ficar indiferentes.
As aulas de português de Portugal/Brasil são um reforço para a imagem da nossa língua na Galiza?
Por enquanto posso dizer que mudou a imagem que as pessoas (alunos, professores, pais…) tinham do português: Estudar português já não é visto como uma excentricidade.
De resto, eu tenho certeza absoluta de que estudar português reforça a língua própria da Galiza, porém para que esse reforço se evidencie é preciso que o estudo do português seja mais sistemático e generalizado.
Foram as aulas de português as que te trouxeram para a AGAL ou fora os teus contatos com pessoas/atividades da AGAL é que te impeliram a lecionares português?
Se eu não tivesse recebido aquela carta assinada por Valentim Fagim de que falei, nunca se teria realizado aquele sonho da minha juventude de dar aulas de português.
Nos meus anos de estudante julgava que AGAL era uma máfia de criminosos. Foi conhecer parte do pessoal que o constitui hoje e o bom trabalho que estão a realizar que me trouxe para esta associação.
Recentemente, participaste num encontro multilateral eTwinning na cidade de Évora, com professorado de língua portuguesa de diferentes países europeus, incluídos representantes de outros locais da Espanha: quais as procedências desse professorado?
Participei, e foi precisamente graças a membros de AGAL, nomeadamente Maria Pinheiro, que pude usufruir deste evento. Fico tão agradecida!
Lá conheci professores de português da Extremadura, Astúrias e Leão que pareciam autênticos galegos quando desatavam a falar português: que engraçado! Aliás, conheci também polacos, franceses e até checos. Lembro destes últimos que julguei estarem zangados e fiquei um bocado assustada, mas logo percebi que era por causa do sotaque deles… E também, com certeza, inúmeros professores portugueses. Foi uma experiência extraordinária e inesquecível.
Poderias dizer-nos se a situação do português no ensino secundário galego está a um nível similar ao da Estremadura, ao de uma escola em Villablino -em Leão- ou ao de uma de Paris? Quais são motivos?
Para já, eles são professores de português especialistas, quer dizer com vagas de português, e não professores de qualquer coisa a lecionar português como na Galiza. Acho uma grandíssima iniquidade não haver vagas de português na Galiza e o pessoal galego especialista em português ter de ir lecionar esta disciplina a outros lugares, enquanto aqui estamos a lecionar português pessoal não especialista.
Como professora de língua no ensino público e mãe, que opinas de iniciativas como a cooperativa de ensino Semente que começou este ano a funcionar em Compostela?
Acho uma iniciativa ótima. Muitos parabéns aos promotores e os meus melhores desejos dum grande sucesso.
Quais deveriam ser as estratégias priorizadas para irradiar entre a sociedade galega que a nossa língua é extensa e útil?
Estive a refletir um bom bocado, mas afinal já percebi: esta pergunta é uma brincadeira, não é?
Conhecendo Vitória S. Regueiro
- Um sítio web: http://www.pglingua.org/
- Um invento: a varinha mágica
- Uma música: “O homem do leme” Xutos e Pontapés.
- Um livro: O pequeno príncipe de Antoine de Saint-Exupéry
- Um facto histórico: A Batalha de São Mamede.
- Um prato na mesa: Salada tropical.
- Um desporto: natação.
- Um filme: A língua das borboletas.
- Uma maravilha: As cantigas de amigo galego-portuguesas.
- Além de galega: portuguesa, brasileira, caboverdiana, angolana, moçambicana, são-tomense, guineense ou timorense.